Vegetariano, vegano, seitan, tofu ou bebida vegetal são termos que já entraram no vocabulário da maioria dos portugueses e que, mesmo que nunca tenham provado ou sejam fãs, conhecem os conceitos. Entre estas palavras associadas a um estilo de vida mais saudável está também a kombucha que, embora comece a ser um nome mais ouvido, o seu conceito ainda não é muito conhecido pela maioria.
Para desfazer o mistério e descobrir mais sobre esta bebida que já integra a alimentação de muitos, a New in Porto foi conhecer a Aquela Kombucha, criada e produzida na cidade. Podemos começar por dizer que é uma bebida milenar com origem na China e que resulta de um processo de fermentação onde entram elementos como açúcar e chá verde ou preto.
O resultado é uma bebida mais ou menos ácida, que tem algum gás natural e que ganhou fama pelos benefícios que pode trazer à saúde, sobretudo ao nível intestinal e do sistema imunitário. Não é alcoólica, embora possa ter uma versão com álcool. E pode ser bebida a qualquer hora ou com qualquer pairing.
Tal como acontece com os iogurtes ou pão mais tradicional — feito com massa mãe —, por exemplo, guarda-se sempre uma parte do produto que dará origem a novas remessas e assim sucessivamente, num ciclo quase infinito. Quem preferir, pode até adicionar sabores e dar rédea solta à imaginação para criar novas bebidas partindo desta base. Mas a melhor pessoa para falar sobre tudo isto é a responsável pela Aquela Kombucha, Maria Lima.
Formada em arquitetura e em produção de moda, Maria, de 33 anos, esteve a trabalhar em Londres na área da moda antes de uma viagem lhe mudar o rumo profissional. Nos últimos três anos, é a kombucha que lhe rouba toda a atenção, mas este não foi um passo que estivesse na sua mente desde o início.
“Em 2017 decidi deixar Londres e vir viver para o Porto, porque sou de cá. Entre uma coisa e outra, fiz uma viagem pela Ásia, fui a Bali — porque tinha uma amiga lá e proporcionou-se — e foi lá que provei a kombucha pela primeira vez. Gosto de experimentar coisas novas, fui, provei e adorei. Fiquei super intrigada com o sabor e passei o resto da viagem a beber kombucha”, começa por explicar à New in Porto.
No regresso à cidade, voltou também à arquitetura e foi trabalhar para um gabinete. Paralelamente, começou a fermentar em casa e a experimentar fazer kombucha, mas sem qualquer expectativa. Estava numa época de mudança, queria procurar uma alimentação mais saudável e vegetariana e esta bebida tinha-a cativado desde a tal viagem.
“Descobri a fermentação e fiquei impressionada como é que nunca tinha pensado no que é a fermentação e na sua importância. A primeira coisa que fermentei foi kombucha, nuns frascos similares aos que estão [expostos] na loja. Foi num frasco de um litro que fiz a primeira fermentação e a cultura foi-me doada por uma amiga.”

Para começar a fazer kombucha é necessário ter kombucha como base. Isso pode conseguir-se através de uma doação de algum amigo, por exemplo, ou comprando essa cultura — como agora é possível fazer na marca portuense, mas já lá vamos.
Maria transformou a cozinha de casa da mãe num laboratório de experimentação e dos frascos passou a ter pequenos tanques. Era suposto ser apenas um hobby, para consumo próprio, mas a palavra espalhou-se e a dada altura já recebia chamadas de pessoas que não conhecia e até de restaurantes a perguntar se vendia kombucha.
“Comecei a sentir que havia procura e não havia grande oferta na altura, não havia praticamente marcas artesanais, então comecei a maturar a ideia e fui procurar um espaço onde pudesse montar uma pequena fábrica”, recorda. “O Bonfim era um bairro que me atraía muito e em que sabia que havia pequenas fábricas, então encontrei este espaço que estava para alugar na altura”.
Depois de mais de um ano de fermentação constante em casa, sentia que já tinha alguma experiência sobre o que era fermentar kombucha, mas sabia que precisava de mais conhecimento. Foi visitar fábricas no estrangeiro e procurou por cá alguém ligado à fermentação de cerveja, que seria a área mais parecida, que pudesse ajudá-la a pensar numa fábrica. Encontrou essa ajuda em António Lopes, da cerveja artesanal Lupum.
“Delineámos um processo, mas eu nunca tinha produzido àquela escala, tenho que admitir que das primeiras vezes pensei se a cultura ia dar-se bem nesta produção em tanques, era uma incógnita.”
Fizeram obras no espaço, montaram a fábrica e tinham tudo praticamente pronto no final de 2019, a contar lançar a marca no início do ano seguinte. Como aconteceu com vários negócios, a pandemia acabou por trocar-lhes um pouco as voltas, mas Maria decidiu avançar mesmo assim e lançar a marca online.
Foi a 9 de maio que Aquela Kombucha chegou ao público e entretanto passaram cerca de três anos.
O objetivo da marca é produzir uma kombucha que seja o mais natural possível, próxima de uma versão caseira e sem pasteurização — uma forma de manter alguns dos benefícios da bebida. A base desta kombucha, ou a sua versão original, é feita com uma mistura de chá verde e chá preto e juntamente a essa há outros dois sabores fixos na carta: gengibre e hortelã pimenta. A partir daí têm trabalhado alguns sabores mais sazonais ou edições especiais que vão lançando.
Em outubro de 2020 abriram um pequeno bar na frente da fábrica onde é possível ir beber uma kombucha, comprá-la e onde vão também testando alguns dos sabores que pensam lançar. Começaram por abrir apenas duas horas ao final do dia e atualmente funciona de segunda-feira a sábado desde manhã até ao final da tarde.
“Sem dúvida que a nossa clientela aqui tem aumentado imenso, desde pessoas que vivem aqui no bairro a turistas que passam aqui”, explica Maria Lima.
Fazer a kombucha desde o início até estar pronta a servir aos clientes é um processo que pode levar uma semana ou até mais. Os tempos vão sendo ajustados em cada lote porque, mesmo que tentem cumprir com alguma consistência de produto, aqui trabalha-se com organismos vivos, o que tem sempre uma margem de imprevisibilidade. É necessário que haja contacto com o ar e o fabrico é agora feito em tanques que levam 500 a 600 litros, o que é muito diferente do pequeno laboratório com que Maria começou em casa.
As visitas
Atualmente, é possível também visitar a fábrica da marca. As visitas acontecem ao sábado às 11 horas, têm um custo de 18€ e incluem prova de diferentes sabores de kombucha. Em alternativa, podem ser feitas noutras ocasiões para grupos, por exemplo, mas depende da disponibilidade da fábrica. Foi essa visita que fomos fazer.
O espaço tem uma pequena esplanada com uma mesa no passeio o que, nesta altura em que começa o bom tempo, já convida e parar. Mesmo antes de entrar pela porta, salta à vista a decoração da montra que está a concurso para as melhores montras de primavera e que aposta nas flores, combinando com o mais recente sabor lançado.
Do lado de dentro, encontramos o bar e uma pequena zona de venda. Aqui é possível fazer uma prova de kombucha, pedir um dos sabores disponíveis à pressão para beber a copo, comprar as garrafas habituais — que também podem ser compradas online — ou até levar para casa a versão a granel, pensada para os clientes habituais.
Feitas de plástico azul estão mesmo ao lado as cortinas que separam esta área pública da área de trabalho e produção. Antes de entrar é necessário calçar proteções nos sapatos para garantir a limpeza do espaço. Ao longe, já se adivinham os tanques de produção.
Numa zona com poucos metros quadrados estão os tanques onde se encontra o scoby — esse início de tudo e que serve de base para a fermentação —, há outros em diferentes pontos de fermentação, tanques de quente onde é feito o chá e outros de frio, onde se termina este processo de fabrico. Aqui, Maria faz uma pequena prova, apenas para ser possível entender como é o produto antes, durante e no final da fermentação e como vai evoluindo.
Há ainda uma zona de engarrafamento que não é demasiado grande porque aqui tudo é feito ainda de forma artesanal. A verdade é que o espaço não é uma daquelas fábricas gigantes, mas a visita costuma durar cerca de uma hora e meia. Além de ver a zona de fabrico, este programa inclui as explicações apaixonadas de Maria sobre o que é a kombucha, como foi criada a marca e, claro, o que estamos a ver ao longo da visita.
O circuito termina já no bar, com a prova de seis diferentes sabores de kombucha. Desde a original à floral, a mais recente, é possível perceber diferenças entre sabor e acidez, sendo que a classificação sobre qual é a melhor fica ao gosto de cada um.
“Aquela Kombucha Floral é uma homenagem à primavera, a nossa estação favorita, uma estação de otimismo, de renascimento. Já no ano passado tínhamos testado uma aromatização com flores aqui no bar e este ano decidimos fazer em garrafa para poder proporcionar este sabor aos nossos parceiros também”, explica Maria.
Esta novidade é também diferente desde a sua base, optando por uma original infusão de flor de camomila e sabugueiro em vez dos chás verde e preto. A esta junta-se ainda a aromatização com pétalas de rosa e hibisco.
Com os olhos postos no futuro, Maria defende as vantagens de estar num bairro muito central da cidade, acreditando que o caminho passará por continuar a ensinar ao público o que é a kombucha. “Tem sido incrível estarmos integrados num bairro da cidade que até é mais residencial mas muito artístico e não estarmos numa zona industrial remota”, sublinha, acrescentando: “O intuito é continuar a fazer o que estamos a fazer, chegar a mais pessoas, passar cada vez mais a mensagem e manter a qualidade e a essência da marca”.
Carregue na galeria para descobrir mais sobre a fábrica Aquela Kombucha.