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Este projeto portuense quer salvar os azulejos da cidade e catalogá-los

Para manter Os Azulejos do Porto, duas amigas criaram a Gazete, onde têm workshops e uma loja online.
Fotografias de Matilde Cunha para Gazete Azulejos.

Era uma vez uma portuguesa de Leiria e uma espanhola de Madrid que se juntaram para preservar os azulejos das fachadas do Porto. Parece uma anedota? Não é, é a história resumida do projeto Os Azulejos do Porto.

Quando em 2016 Alba Plaza, designer gráfica com 41 anos, de Madrid, se mudou para o Porto, o objetivo era mudar de cidade, começar do zero noutro lugar, de preferência com o mar por perto. Essa mudança, através de amigos em comum, trouxe à sua vida Marisa Ferreira, de 43 anos. Embora natural de Leiria, veio para o Porto em 2001 para estudar e tinha dedicado a sua vida até então à produção cultural e mais recentemente ao empreendedorismo cultural ligado ao património.

Através deste encontro perceberam que tinham em comum uma curiosidade sobre os azulejos que cobrem a fachada de muitos edifícios portuenses e foi a partir daí que começaram a investigar mais. Assim nasceu o projeto Os Azulejos do Porto, que começou como um conjunto de fotografias numa página de Instagram mas que tem vindo a tornar-se num completo catálogo dos azulejos da cidade.

“Tudo começou porque a Alba veio de Madrid viver para o Porto e fez-me imensas questões sobre os azulejos que se encontram nas fachadas — porque em 2016 ela começou a ver muitos edifícios que estavam a perder os azulejos nas reconstruções, estavam a mandá-los para o lixo, a serem destruídos e ela não entendia muito bem porque é que aquilo estava a acontecer”, começa por explicar à New in Porto Marisa.

De facto, Alba pensava que os azulejos eram vistos como parte do património e que haveria algum mecanismo que os protegesse das obras ou que os preservasse num museu. “Comecei a perguntar porque é que isto acontece, se aqui não há museus de azulejos, algum sítio onde se possa falar sobre isto, fábricas, onde é que se pode ver a fazer, ter informações, de onde vêm os padrões, quem é que os desenhava”, aponta a espanhola.

Juntas, procuraram informar-se melhor sobre tudo isto, ler os livros que encontraram, ir a diferentes museus e bibliotecas ou até ao banco de materiais. Foi nesse processo que perceberam que havia muito para fazer em prol da preservação do azulejo.

“O que nos ocorreu foi criar um Instagram e um site onde começámos a fotografar todos os azulejos que se encontram nas fachadas para que, no futuro, as pessoas possam saber os padrões que existiram no Porto”, diz Marisa.

Com isto perceberam que existiam edifícios com padrões únicos e que era necessário preservar essa memória. Sobretudo porque os azulejos identificam o País e são até uma atração para muitos turistas, que não deveria perder-se.

Neste processo de catalogação, percorrem as ruas da cidade em busca de azulejos de padrões no exterior dos edifícios. Fazem-no com as peças de padrão porque as outras estão mais resguardadas por se encontrarem em grande parte em igrejas, por exemplo. A escolha sobre os azulejos exteriores prende-se também com a facilidade de acesso e focam-se no Porto porque seria difícil alargar às cidades envolventes, uma vez que são apenas duas.

No site d’Os Azulejos do Porto é possível encontrar mais de 300 padrões, mas estimam que na cidade haja perto de 1000 diferentes. Com livre acesso, cada imagem apresenta o maior número de dados que encontram, desde a sua localização ao tamanho, as cores e técnicas usadas, a fábrica onde foram feitos ou o período histórico a que dizem respeito.

“Ao percebermos que havia essa falta de informação sobre a forma de produzir os azulejos, foi aí que juntámos dois em um, ajudar e termos uma ajuda em todo o trabalho que estávamos a desenvolver. Tentámos obter ajudas em várias instituições mas como não somos uma empresa não conseguimos qualquer tipo de apoio”, conta Marisa.

Para não terem que parar com o projeto de catalogação e preservação dos azulejos do Porto, decidiram criar a Gazete Azulejos. Através deste atelier fazem workshops onde explicam como são feitos os azulejos e fazem ainda azulejos sob encomenda, sejam réplicas dos modelos que têm no catálogo ou de padrões que estejam na casa de alguém que queira completar ou recuperar uma zona, por exemplo. É desta forma que, com o seu trabalho de workshops e venda de azulejos, conseguem manter de forma autossuficiente o projeto de preservação.

“O azulejo faz parte da memória coletiva, do nosso património português, identidade da nossa cultura. Com esses workshops e a catalogação estamos a tentar com os nossos meios salvaguardar o azulejo de fachada da cidade do Porto”, resume Marisa, ao que Alba completa: “O Porto sem azulejos seria uma cidade completamente diferente, forma parte do carácter da cidade e achamos importante catalogá-los também”.

Cada vez mais apaixonadas pelos azulejos portuenses, defendem que a lei deveria pensar mais nesta parte do património e arranjar uma forma de mantê-lo, para que não se perca nas reconstruções ou simplesmente porque os portugueses desvalorizem e achem os azulejos uma moda ultrapassada. Através da sua experiência na Gazete Azulejos, dizem até que são os estrangeiros quem mais procura este projeto e se mostra interessado nesta arte.

Para quem ficou curioso, os workshops têm a duração de duas horas e um custo de 33€. Nesse tempo, além de aprenderem mais sobre esta arte, os participantes podem pintar dois azulejos — e nem é preciso ter grandes dotes artísticos —, aprender várias técnicas diferentes. O resultado final podem ir buscar no dia seguinte, depois de ser devidamente cozido.

Para o futuro, o desejo destas duas ativistas dos azulejos é que seja criado um museu, um espaço grande onde possam exibir azulejos, contar a sua história e dar aulas. “Íamos ficar muito felizes se houvesse um museu, aquilo que nós estamos a fazer mas em ponto grande”, aponta Marisa.

Em jeito de pedido, Alba deixa um recado: “É importante dizer às pessoas que cuidem dos azulejos, se tiverem azulejos em casa não os deitem fora porque têm muito valor patrimonial e monetário também. Às vezes as pessoas esquecem-se que o valor patrimonial é também dinheiro”. “No futuro, se continuarmos a perder tantos azulejos, os edifícios que sobrarem com os azulejos originais vão ser muito mais valiosos. De certeza que no futuro vai haver um grande arrependimento de alguns edifícios que já perderam o azulejo”, remata Marisa.

Carregue na galeria para descobrir mais sobre estes dois projetos.

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