Daqui a uns meses, o Ateneu Comercial do Porto vai celebrar 153 anos de história e nada melhor do que fazê-lo abrindo as suas portas aos portuenses e a todos os que o queiram visitar. Apesar de continuar a ser um clube privado de cavalheiros — e damas —, quer tornar-se cada vez mais aberto à cidade e àqueles que por ali passam.
Foi a 29 de agosto de 1869 que um grupo de empregados do comércio e pequenos comerciantes fundaram o Ateneu. Esta instituição reconhecida na cidade pelo seu prestígio tem desde a sua fundação objetivos de “entretenimento, educação, formação e a constituição de uma biblioteca que tinha a ver com a elevação social das pessoas”, explica à New in Porto o atual presidente, Rogério Gomes.
No cargo há cerca de cinco anos, desde o início que assumiu como missão “abrir o Ateneu à cidade”. Entre os primeiros passos para essa maior abertura está o acolhimento da exposição fotográfica “Ruralidades”, de Jorge Bacelar, que ocupa os corredores do primeiro piso do edifício desde 29 de janeiro e até 28 de fevereiro.
Quem passa na Rua Passos Manuel pode até nem perceber rapidamente o que se passa no número 44. É normal. Aquelas portas albergam um dos clubes privados do Porto, por isso a discrição é muito prezada por aqui. Lá dentro, a arquitetura é a clássica da época, com os tetos e paredes trabalhados, um estilo apalaçado menos visto hoje em dia e uma certa imponência que começa logo na escadaria da entrada.
Nas paredes há quadros valiosos de pintores conhecidos e espalhadas pelas várias salas é possível encontrar relíquias como um esboço da estátua de Almeida Garrett que se encontra na frente da Câmara Municipal do Porto, contadores com vários séculos ou bustos de diversas personalidades. Parte disto é visível quando se percorre os espaços alugados para eventos como o Salão Nobre — onde é habitual terem lugar os concertos Candlelight —, o restaurante onde está o Sala Meat.ing Point ou a antiga sala de bilhares onde agora encontramos o bar Clube Porto Rugby.
Noutras zonas menos acessíveis há uma grande biblioteca onde os sócios podiam ler os jornais do dia ou algum dos livros aí guardados, salas de receção, salas para jogar bridge, um bar exclusivo e até um detalhe secreto: uma barbearia escondida que deixou de funcionar nos anos 70. Na sala da direção há outras relíquias para descobrir, como quadros com retratos de antigos presidentes do Ateneu, moedas de coleção ou uma espada de Mouzinho de Albuquerque. Aí estão também vários documentos antigos que estão agora a ser estudados por um especialista para confirmar ou descobrir histórias que aqui se passaram.
Nesse campo, são inúmeras as peripécias que aconteceram no Ateneu ao longo de tantas décadas — umas mais confirmadas do que outras. Foi neste espaço que Guilhermina Suggia deu o seu primeiro concerto, onde Antero de Quental terá lançado um manifesto contra o Ultimato Inglês e até onde Camilo Castelo Branco possa ter estado antes de ser preso. Nem a PIDE aqui entrava.
“O primeiro prémio literário do Miguel torga foi ganho aqui. No júri estava o Vitorino Nemésio e concorreu Sophia de Mello Breyner, Ary dos Santos e tudo o que era poeta conhecido, em 1953”, conta Rogério Gomes.
Outra das grandes relíquias do Ateneu é uma primeira edição de “Os Lusíadas”, de Camões. A 12 de março, vai ser exposta e haverá um colóquio em comemoração do lançamento da obra, num evento que marca novamente a abertura do local à cidade.
“Foi comprada em 1903 por 175 mil reis. Houve um sócio que ofereceu 100 mil e o Ateneu suportou o resto. Ainda não descobrimos a origem de onde veio o livro, temos a ata da compra mas não a origem.”
Março será também o mês que marca o lançamento da grande novidade do Ateneu: as visitas guiadas. Ainda não há uma data ao certo nem um formato fechado, mas já se sabe que as visitas terão um guia, serão destinadas a pequenos grupos e haverá um suporte audiovisual.
“O que o Ateneu está a fazer é, passo a passo, abrir o seu património às visitas, a sua historia à cidade, ser explicada e as pessoas conhecerem principalmente as histórias que aconteceram aqui, que foram muitas e algumas delas muito importantes.”
Hoje em dia, o Ateneu está longe de ser o local exclusivo para homens de letras, das artes e do comércio, como era visto por muitos há alguns anos. As salas podem ser alugadas e o processo para tornar-se sócio está aberto a todos.
“Ser associado custa 200€ por ano, precisa de fazer uma candidatura e ser aprovada na reunião da direção, mas neste momento não há obstáculo nenhum [a novos sócios].”
Toda esta abertura do Ateneu Comercial do Porto é não só uma forma de aproximar-se aos portuenses mas também de promover o seu património e, noutro ponto de vista, tentar juntar fundos para algumas obras que o edifício precisa. Até porque, em última análise, os estatutos prevêm que, caso o Ateneu vá à falência ou feche por qualquer motivo, todo o seu património será da cidade.
Carregue na galeria para descobrir alguns dos recantos deste lugar histórico.