Passaram mais de dez anos desde que Filipe Pinto venceu a terceira edição de “Ídolos”. Depois de dois álbuns de originais, o músico portuense acaba de apresentar um novo single, “Cair Em Mim”. O videoclipe da canção — cujo tema são as memórias — estreou a 20 de abril e desde aí já conta com mais de 4,5 mil visualizações no YouTube. Realizado por João Nuno Brochado, o vídeo que acompanha a música mostra imagens do Porto e dos concelhos envolventes, numa espécie de viagem pelas paisagens da região que tanto dizem ao artista.
A partir do momento em que venceu o concurso de talentos da SIC, o artista, que é também formado em Engenharia Florestal, estudou na London Music School e desenvolveu um conjunto de projetos ligados ao ambiente com os miúdos como público-alvo. O segundo álbum de originais, “E Tudo Gira”, tinha sido lançado em 2016 e agora já prepara o próximo, que deverá sair até ao final deste ano.
A New in Porto esteve à conversa com Filipe Pinto para conhecer as novidades e descobrir o que o músico tem feito nos últimos anos.
O que é que nos pode contar sobre este novo single?
O “Cair em Mim” é uma canção que remete para as recordações que ficam quando sentimos falta de alguém ou de algum ente querido, uma pessoa amiga. Quis tentar que a canção fosse o mais abrangente possível, mas retratando esta ideia de recordação que fica na memória, lembrança que não se vai embora. É um single de estreia do meu novo disco, que está previsto ser lançado no final deste ano, “Telhados de Vidro”, e tenho tido boa aceitação do single. Vou fazer agora em breve uma versão ao vivo para as pessoas também ouvirem não só a versão estúdio mas também conhecerem a música ao vivo. Estou muito contente mesmo.
O videoclipe tem imensas imagens do Porto. Porquê? Qual a sua relação com o Porto?
O videoclipe dependeu de vários fatores. Um deles é o realizador, o João Nuno Brochado, que está neste momento em Macau. Ele é uma pessoa excecional mesmo a nível de conceito e a ideia que lhe transmiti para a canção foi termos algo relacionado com esperança, com renovação e o mar traduz isso mesmo. Ele fez todo o processo de mapeamento dos sítios onde nós íamos porque do ponto de vista da logística também era mais fácil ser aqui na zona do Porto. Desde que trabalho com ele na área da realização, sempre lhe confessei que gostava que os meus videoclips transmitissem lugares bonitos em Portugal. Desde “Amor Tem Si” que nós tentamos ir a zonas bonitas do País e captar isso quase como se fosse um quadro vivo dos sítios por onde passo e no fundo sou um narrador desses lugares. [Neste caso] filmámos aqui no Grande Porto, sobretudo no lado também de Gaia. Queríamos ter também o apoio da CP —conseguimos — para filmar nos comboios porque é uma ideia de viagem, de introspeção, de meditação e essa música acho que resultou muito bem. Também tivemos o apoio e autorização para irmos a um cemitério inglês que existe aqui no Porto, que se calhar algumas pessoas não conhecem, que é o Saint James Church e eu fiquei muito contente.
Qual é a importância de ser um músico portuense no panorama da música nacional?
É reforçar a ideia de uma cidade que tem muitos pontos para se ver, turísticos, mas também o sítio onde vivo, onde passo a maior parte da minha vida desde que voltei de Londres, portanto foi uma vontade também inerente em mostrar a minha cidade e as minhas raízes, o lugar onde escrevo canções. Na verdade, no resto do álbum, temos outras canções que foram filmadas noutro tipo de cenários. Este “Cair em Mim” foi um regresso também das músicas originais, eu gostava de enfatizar que seria no Porto, acho que também acabo por demonstrar o sítio onde gosto de estar.
Em Portugal, é diferente ser um músico que vive no Porto do que um que mora em Lisboa?
Sim, claro. Viver no Porto tem as suas vantagens mas também as suas desvantagens. A nível profissional, torna-nos um bocadinho mais distantes da metrópole e daquilo que acontece em Lisboa sob o ponto de vista de comunicação, de acesso à informação, aos media, tudo é mais fácil se viveres em Lisboa. Não quero pôr isso como bloqueio do meu processo de carreira, o percurso musical, mas tem a sua influência. É um aspeto negativo, mas essa também foi uma decisão que tomei quando deixei Lisboa. Vivi em Lisboa depois de Londres, fiquei um ano em Lisboa no lançamento do meu primeiro disco, o “Cerne”, mas depois tomei essa decisão na minha cabeça que queria viver no Porto e dar prioridade ao sítio onde me sentia mais feliz e estava habituado. Obviamente tomei isso com consciência, sabendo que poderia não ter tanta exposição mediática quanto teria se estivesse em Lisboa. Se calhar tanta abordagem também com outros músicos que vivem em Lisboa, na sua maioria, mas é uma opção e há muitos músicos também que vivem no Porto e noutros sítios, no Minho, não é por aí que deixam de fazer o seu trabalho. Não quero de modo algum achar e justificar que o facto de viver no Porto deixa de contribuir para eu poder fazer as minhas canções e mostrar ao público aquilo que mais amo.
Já passaram mais de dez anos desde o “Ídolos”. O que é que mudou na sua vida, na carreira, ao longo deste tempo?
Foi um crescimento. Acho que, sobretudo, foi acreditar que posso viver da música e poder viver da música não significa só dar concertos e andar na estrada, é muito mais do que isso. Acho que há muito por onde se pegar e não é por acaso que, justificando isso, tenho um projeto infantil que se chama “O Planeta Limpo”, que também conta com dez anos de existência. É um projeto em parceria com a Betweien e de facto já estamos há dez anos na estrada, nas escolas, em auditórios. Relaciono a música com o ambiente, portanto, há aqui outra matriz que se coloca, não só concertos ao vivo mas também esta questão de auxiliar aquilo que é o meu conhecimento na área ambiental e tentar canalizá-lo para a música e para as artes, que é um lado que também aprecio. Sinto-me muito feliz com esse projeto, além de outros que quero também construir e outros que fui fazendo — canções para outros artistas. Também houve uma altura que eu fiz canções que apareciam também em novelas ou em outro tipo de ferramentas e cujos direitos de autor também acabam por ser um salário do autor. Há outros mecanismos que nos facilitam e que se podem seguir. Agora também há uma indústria que está a crescer muito que é compores canções cá e serem depois lançadas noutros sítios, fazeres samples, fazeres apenas beats. Portanto, todo esse mercado existe e está para ficar, o digital também cresceu imenso. Hoje em dia o disco físico deixou de ter muita relevância, deixou de ter o peso que tinha, mas não quero abdicar disso, a minha raiz é querer sempre ter um objeto físico, sempre fui muito habituado a isso e quero também mostrar que o meu trabalho tem esse conteúdo físico, portanto para mim faz sentido esse cariz também físico do disco.
Como é que se liga agora a música com a Engenharia Florestal?
É através destes projetos educativos. A Engenharia Florestal ficou em 2010, mas não deixei de procurar, de pesquisar, de me informar, porque é uma coisa que gosto e que me sinto sempre curioso pelas novidades que vão surgindo. A questão das alterações climáticas também mexe comigo porque, sendo pai agora tenho outro tipo de atenção a essas questões. Já ando a espalhar a semente nos meus filhos, há aqui dois mundos em que sempre vivi, o ambiente e a música. Sempre que se lembrarem do Filipe Pinto, vou estar sempre associado a isso porque faz parte de mim. Temos também agora um projeto recente que se chama “Ambiente Ação” e vou apresentá-lo ao terceiro ciclo, é no fundo uma palestra, um conjunto de atividades que vamos fazendo com os mais jovens para lhes explicar as problemáticas e possíveis soluções que nós podemos ter no nosso dia a dia para ajudar o ambiente. Isto, lá está, relaciona a música com o ambiente, são sempre os dois elos de ligação no meu trabalho.
Apesar de nos últimos anos o público não ter visto um novo álbum e mais músicas novas, houve muito trabalho feito.
Sim, não tenho deixado de trabalhar, a altura em que parei foi na pandemia, mas isso fomos todos. Há aqui um fosso, um espaçamento grande entre o segundo disco de originais, “E Tudo Gira”, em 2016, e agora este em 2023 porque na realidade este disco eu queria apresentá-lo já antes da pandemia mas entretanto tive alguns imprevistos que dificultaram o lançamento do disco, mas não significa que tenha estado parado. […] Não tinha ainda o número suficiente de canções que gostaria para editar o tal disco e chegou o momento, agora sinto que faz todo o sentido lançar este disco, pela fase também que atravesso de paternidade, de relação mais comigo porque cheguei aos 30 anos, a pessoa também mete certas coisas em causa, pensa noutras coisas. Há aqui uma fragilidade que está inerente à minha fase da vida e “Telhados de Vidro” resulta exatamente disso, desse julgamento que se calhar fazia quando era mais novo e que agora estou a entrelaçar os pés e as mãos porque acabo por fazer as mesmas coisas, os mesmos erros, coisas que achava que eram de uma determinada maneira sob o ponto de vista musical e que se calhar não fazia sentido, se calhar devia ter aberto mais o horizonte, a minha forma de compor, de me expor. Há uma tentativa da minha parte de sair da minha zona de conforto e isso está espelhado, acho eu, neste disco até pela sonoridade. É um disco mais eletrónico, tem um apoio de um grande amigo que é o Luís Montenegro, que me ajudou muito no processo de composição e estou super feliz com o resultado.
E para o futuro, quais são as ideias?
A minha intenção agora é, no final deste ano, lançar então o disco, ter dois concertos de apresentação oficiais. Depois, queria andar na estrada, mas vai depender um bocadinho da abordagem que terei com a comunicação. Depois da pandemia aconteceu algo inédito, acho que nunca aconteceu isto no nosso meio musical, que é toda a gente estar a lançar coisas novas. Há um boom gigante de artistas, de bandas, que já não faziam discos há muitos anos e estão a querer voltar. Há aqui uma dificuldade muito grande da imprensa de gerir toda a informação e, portanto, tenho que também ter essa consciência que vou ter o meu espaço, mas tenho que saber que vai ter que sair muito trabalho de mim também, de inovação, de coisas novas que eu queira fazer diferentes. Vai ser muito por aí, acho que vou tentar ter o meu cantinho, o meu espaço de comunicação e mostrar projetos novos. Um deles, que gostava de fazer, é uma digressão e já tive o privilégio de fazer algumas. Estou a pensar fazer algo do género mas num conceito diferente. Isso é um dos aspetos. O outro é ligado ao ambiente também, este projeto “Ambiente Ação” é bastante recente. O “Planeta Limpo” continuará também para o primeiro ciclo nas escolas e nos auditórios e outros projetos que tenho aqui na gaveta que queria ver se os punha cá fora porque na verdade eles estão quase prontos, falta só ter algum tempo para poder mostrar às pessoas. Quero continuar a formar-me e a crescer também como pessoa.