Com cerca de 50 anos de história, a Seiva Trupe acaba de ganhar uma nova casa, a Sala Estúdio Perpétuo. Depois de estrear a nova morada com “Três Mulheres em Torno de um Piano”, em abril, é a vez de levar a cena a peça “Éramos Todas Azucenas”, que sobe a palco de 2 a 6 de junho.
Interpretada por Sandra Salomé, a obra de Zinaida Gambaro traduzida e encenada por Jorge Castro Guedes conta a história de uma mulher com cerca de 40 anos, que vive a ditadura argentina da década de 70 e que se queixa disso mesmo. O palco passa a ser o cenário ideal para as várias situações onde aquela mulher poderia estar, sejam elas um tribunal, uma escola ou uma qualquer rua de um bairro da cidade.
“Perdida por entre a dor de mãe que desconhece o paradeiro do filho, os sonhos de juventude e a alegria da infância, evoca os acontecimentos com repulsa e uma paixão por Buenos Aires e os seus mitos”, explica a companhia.
A peça estará em cena quinta e segunda-feira às 21h30, sendo que de sexta-feira a domingo a sessão será às 19 horas. Os bilhetes já estão à venda online e custam 12€.
A equipa é ainda composta por Filipa Carolina na direção de guarda-roupa, Vladimiro Alcindo na edição de som, Júlio Filipe na edição de luz e Inês Filipe na assistência de encenação.

Fundada inicialmente por António Reis, Estrela Novais e Júlio Cardoso, entre 1972 e 1973 — embora a data oficial seja 11 de setembro de 1973 —, a Seiva Trupe afirmou-se ao longo dos anos como uma das mais importantes companhias de teatro do Porto. Tanto que em 1993 passou a ser reconhecida como Entidade de Utilidade Pública e, em março de 2010, foi condecorada com o grau de Membro-Honorário da Ordem do Mérito.
Era a companhia residente do Teatro do Campo Alegre quando, em 2013, viu ser ordenado o seu despejo pelo presidente da Câmara Municipal do Porto que cessava funções naquela altura, Rui Rio. Desde aí, andou de um lado para o outro sem uma casa que pudesse chamar de sua. Até agora.
Desde o início deste ano, é na Sala Estúdio Perpétuo que passa a poder encontrar a Seiva Trupe e as suas produções, que voltam agora a apresentar-se à cidade e a querer retomar a proximidade com o público portuense. Sobre tudo isto, a New in Porto esteve à conversa com o atual diretor artístico da companhia, Jorge Castro Guedes.
“Quando assumi a direção artística, há três anos, a convite do meu antecessor, Júlio Cardoso, o que encontrei foi uma situação bastante difícil porque uma coisa é saber que uma estrutura tem uma casa onde podemos ir encontrá-la, outra é durante nove anos hoje está aqui amanhã ali. Quebra-se aquilo que costumamos chamar a corrente de público”, diz.
Sabendo que a cidade também está diferente, Castro Guedes acredita que não será num ou dois anos que se conseguirá atrair novamente o público para um espaço que também ele esteve fechado durante décadas. Serão necessários talvez quatro ou cinco anos para conquistar novos públicos e, sobretudo, apostar numa comunicação eficaz.
“Nestes três anos, ainda por cima constantemente interrompidos com as crises da pandemia, o que posso dizer é que a primeira coisa que fizemos foi procurar ir ao encontro da cidade”, reforça.
Para chegar mais perto do público, o dia a dia da Seiva Trupe passa hoje por muito trabalho. Trabalhar afincadamente todos os dias para produzir mais e melhor e apostar em estratégias diversas para atrair os espectadores. “Não queremos abrir portas e ficar à espera que o público apareça. Queremos que este seja um ponto onde uma parte significativa da cidade se reveja como um local de lazer”, garante o encenador.

Sendo uma companhia de teatro profissional, a Seiva Trupe orgulha-se de trabalhar apenas com artistas profissionais. Ainda assim, Castro Guedes lamenta a precariedade da profissão e o pouco investimento por parte do governo na área da cultura.
“Acho que não é possível fazer muito mais enquanto se olhar para a cultura como se olha”, afirma, acrescentando: “É preciso não esquecer que os órgãos de poder, de uma forma geral, são o retrato das próprias populações e nós temos uma população com uma grande falta de massa crítica; naturalmente temos um conjunto de governantes com uma total falta de massa crítica”.
Como uma das estratégias fundamentais para melhorar a cultura do País e a forma como o público em geral olha para as artes, o responsável da Seiva Trupe acredita que a chave está na educação.
“O maior problema português é o da educação. Quando daqui a duas, três ou quatro gerações se resolver apostar a sério na educação, nessa altura talvez isto comece a ser diferente”, aponta, dizendo ainda: “Não é preciso educar o público, é preciso é as pessoas terem educação e acesso a um ensino que seja verdadeiramente democrático. A massificação do ensino, apenas haver abertura para que muitos jovens possam frequentar as escolas, não significa a democratização do ensino”.
Para um futuro próximo, o objetivo da companhia passará por tentar fidelizar o público e conseguir aumentar a média de espectadores por sessão, bem como o tempo em que cada peça fica em cena. “Neste momento, direi que o próximo desígnio é no espaço de quatro anos a Seiva Trupe ter recuperado grande parte do seu público e poder estar confortavelmente com médias dignas de uma cidade como é a do Porto”, remata Castro Guedes.