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Luís Ismael: “Este filme é um presente para as pessoas que não nos deixaram esquecer”

“Balas & Bolinhos: Só Mais Uma Coisa” estreia no cinema esta quinta-feira. Apesar da falta de meios, a produção demorou poucos meses.
A quadrilha mais cómica e incompetente está de volta.

Juntar as “balas” dos criminosos aos “bolinhos” de bacalhau numa espécie de imaginário de gangster à portuguesa. Este foi desde o início o propósito de Luís Ismael, criador, realizador e argumentista da famosa saga “Balas & Bolinhos”. O quarto filme da saga estreia esta quinta-feira, 15 de agosto, nos cinemas portugueses.

Nada faria imaginar que a improvável comédia portuguesa teria esta dimensão. Em 2001, foi lançado o primeiro, com apenas 63 minutos, no festival Fantasporto. Em março de 2003, estreou na SIC Radical, sem ter passado pelos cinemas. A comédia assumidamente “chunga” sobre os “cromos que vão encher a tua caderneta”, feita com poucos recursos para valorizar o espírito do norte, e especificamente portuense e valonguense, tornou-se um fenómeno.

O segundo filme, mais ambicioso e com outros meios, chegou em setembro de 2004. Com mais de 57 mil espectadores, “Balas & Bolinhos — O Regresso” foi o maior sucesso nacional desse ano nos cinemas. Os fãs desesperaram por um terceiro filme com os criminosos amadores e incompetentes, mas outros projetos desdobraram a equipa. Por isso, este universo só voltou aos cinemas em 2012. 

Sem apoio do Estado, mas com um orçamento reforçado, incluindo uma mão cheia de personalidades da televisão, “Balas & Bolinhos — O Último Capítulo” superou os 250 mil espectadores — permanecendo, até hoje, como o oitavo maior sucesso de sempre do cinema português nas bilheteiras.

Durante a pandemia, a quadrilha mais famosa do cinema nacional tencionava festejar os 20 anos do projeto com o lançamento de um quarto filme. Mas as comemorações nunca aconteceram.

“Sentimos que as pessoas precisavam de um pouco de humor e distração à volta. Estávamos todos em casa, então decidimos divulgar curtas-metragens e alguns inéditos, libertámos muito conteúdo e acabámos por ficar sem nada. Virados cinco anos, decidimos que estava na hora de comemorar os 25 anos das “balas” e dos “bolinhos” à rigor”, explica Luís Ismael à NiP, na antestreia do quarto filme, “Balas & Bolinhos: Só Mais Uma Coisa”, esta terça-feira, 13.  

O realizador Luís Ismael.

Esta produção traz de volta o Tone (Ismael), a “mente brilhante do crime”, e os seus companheiros, tão amadores e incompetentes como ele. “Culatra (J. D. Duarte), Rato (Jorge Neto), Bino (Joaõ Pires) e Tone são obrigados a voltar para casa dos seus pais e ali tentam uma vez mais agarrar a oportunidade das suas vidas. Mas tudo se complica quando esta reunião se transforma numa verdadeira confusão”, resume a sinopse oficial. 

“É uma boa ocasião para dar um presente a todas as pessoas que não nos deixaram esquecer. O filme é um presente para essas pessoas que nos tem nas vidas deles, com as suas expressões, com as suas perguntas diárias por um próximo filme. Apenas queremos que desfrutem do filme tanto quanto nós ao fazê-lo. E a lição que devem levar é: não levem as coisas demasiado a sério”, acrescenta o realizador, de 52 anos.

A produção do quarto filme arrancou em maio deste ano. Luís Ismael admite o maior desafio ter sido “ter muito para fazer, pouco tempo e sobretudo pouco dinheiro”. E conclui: “É o desafio de sempre em Portugal”.

“Balas & Bolinhos: Só Mais Uma Coisa” apresenta-se como uma versão melhorada do primeiro filme da saga.

“É um regresso às origens. Gostámos de dizer que é um ‘Balas & Bolinhos 1, 2.0.’, com algumas necessidades que tínhamos no primeiro e neste finalmente consolidam-se. É um filme verdadeiramente tuga, não como os anteriores e sobretudo o terceiro, que era mais bluckbuster. É muito tuga, rural”.

Neste filme, serão desvendadas personagens amigas dos protagonistas, que foram mencionadas no primeiro filme mas nunca tinha aparecido. 

“Estamos na mesma posição de quando lançamos o terceiro filme. No primeiro ‘Balas & Bolinhas’ nem sequer tínhamos a certeza que iríamos conseguir acabar com a produção, quanto mais imaginar que estaríamos aqui hoje. Os filmes são feitos para o público. Só eles vão decidir se há mais para ver deste gangster tuga”, reforça o autor.

O universo de “Balas & Bolinhos” surgiu na sequência de um episódio em particular. “Certo dia, o meu pai pediu-me para ficar de olho em dois trolhas que construíam um muro junto da minha casa. Disse-me: ‘Estou a pagar-lhes ao dia, fica ali por perto, se não eles não trabalham’. Eles começaram a falar comigo, conversámos, rimos e percebi que, de facto, havia ali matéria muito gira. Falavam de coisas banais, mas com uma grandiosidade incrível. Estes diálogos são diálogos que gostava de ter num filme meu, pensei. Até que, de repente, passou um sujeito por ali e pediu um cigarro. Estavam a chapar massa na parede, de repente, um dos trolhas pára, vai ao bolso e o outro diz-lhe: ‘Vais dar-lhe um cigarro?’ E o gajo que pediu diz: ‘Porquê, ó meu grande filho da puta, estou a falar contigo?’ Começam a insultar-se reciprocamente, olho para o chão, vejo picaretas, ferros e penso: alguém vai morrer por causa de um cigarro. Subitamente, do nada, um simples pedido de um cigarro, espoletou uma merda tão gravosa. Como é possível? Aí, pensei: está aqui o caminho que tenho de seguir para o filme”, recorda Luís.

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