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Nova peça da Seiva Trupe revela a solidão da Guerra Colonial pouco explorada (ou esquecida)

A obra estreia no Porto esta quinta-feira, 7 de março, e fica em cena até dia 27 antes de começar digressão nacional.
Está em cena até 27 de março.

Com mais de 50 anos de história, a Seiva Trupe regressa aos palcos em 2024 com uma peça que, além de homenagear e relembrar os valores do 25 de Abril, quer mostrar a solidão vivida (e desde então esquecida) na Guerra Colonial. Com texto e encenação de Castro Guedes, “A Solidão numa noite no Capim” transporta-nos à noite antes do 25 de Abril de 1974, em Angola, onde um soldado português e um guerrilheiro se encontram casualmente. O medo e a desconfiança um do outro começam a desvanecer à medida que partilham um outro medo: animais ferozes.

Noite dentro, os dois “inimigos” começam a acreditar que não são os dois homens que fazem a guerra, mas antes os uniformes. Começam a partilhar recordações, cigarros, cervejas, salpicão e até a própria solidão que, interna e pessoalmente, cada soldado vivia no meio da Guerra Colonial.

Enquanto esperam que o dia nasça, surge mais um medo: o que vai fazer cada um com o outro? A aproximação da aurora chega com o comunicado do MFA na rádio: estamos na madrugada do 25 de Abril de 1974. Mas será que isso significa um “happy ending” para ambos os soldados?

Entre emoções fortes e suaves, os dois homens reparam no papel humano de cada um num cenário fora do combate, conhecendo mais sobre si próprios e sobre o outro. Decididos que nenhum vai matar ou prender o outro e que vão eventualmente retomar as suas caminhadas, assim que nasça o sol, uma nova situação os opõe: o suposto guerrilheiro é um membro do corpo especial “Flechas” (africanos recrutados para combater ao lado do Exército Português) e o oficial miliciano português ia em missão avisar os guerrilheiros de um ataque. Ambos convergiam, aliás, de lados opostos, para o mesmo aldeamento.

A situação de ‘inimigos de guerra’ reacende-se no sentido inverso, amenizado pelas cumplicidades de uma noite e uma quase amizade que nelas nasce. Já nascido o dia, chega num rádio transístor, perdido pelo português durante a noite, onde ouvem o esperado comunicado do MFA: houve uma revolução. Apesar do aparente final feliz, a história não acaba aqui. Com um abraço, ambos os soldados se despedem, deixando um fim em aberto para o público. 

Óscar Branco e Fernando André dão vida a estas duas personagens que, no meio de uma suposta rivalidade, criam uma amizade. Para Fernando, o maior desafio foi viver uma época que não é a dele. “Para conseguir interpretar e dar vida à minha personagem, tive de fazer uma grande pesquisa sobra a época e sobretudo sobre a Guerra Colonial porque é algo que nunca vivi, contudo penso que as pessoas não vão ficar indiferentes à mensagem que queremos passar”, conta o jovem à NiP.

Já Óscar Branco encara este papel como o seu regresso ao drama. “Durante muitos anos estive ligado à comédia, mas foi uma viagem interessante atrás no tempo para transmitir os valores esquecidos da Guerra Colonial que, hoje em dia, ainda precisam ser discutidos. É uma mensagem sobretudo, de identidades”, confessa à NiP, acrescentando: “Mesmo no pós 25 de Abril, as pessoas continuavam muito no seu lado e no seu canto, este espetáculo representa o luto ou quase uma terapia de grupo no fim da guerra, é falar de um assunto que toda a gente se esqueceu”.

“Mais do que celebrar a revolução do 25 de Abril, queremos trazer ao público uma parte esquecida da história colonial. Para muitos, pode ser um assunto muito delicado porque às vezes os traumas da história trazem esquecimentos. No fundo, o espetáculo quer tocar na questão histórica e política da Guerra Colonial e do 25 de Abril”, acrescenta Sandra Salomé, assistente de encenação e co-cenografia.

“A Solidão numa noite no Capim” estreia esta quinta-feira, 7 de março, na casa da Seiva Trupe na Sala Estúdio Perpétuo, próxima da estação de metro do Marquês. Ficará em cena até ao dia 27 de março, altura em que dará início a uma digressão nacional que irá passar por Gondomar, Vila Flor, Caldas da Rainha, Vila Praia Âncora, Santa Maria da Feira, Vila Nova de Gaia e Póvoa do Varzim.

Poderá assistir à peça nas quartas e quintas-feiras, pelas 19h30, sextas e segundas-feiras, às 21 horas e, sábados e domingos, às 18 horas. Os bilhetes custam 15€ e podem ser adquiridos através do email info.reservas.st@nullgmail.com.

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