“Comecei a precisar de tomar [oxicodona] com mais frequência para sentir os efeitos anestesiantes.” Tiago Castro vivia em Nova Iorque, nos EUA, em casa de um amigo, quando percebeu que os analgésicos que tomava há algumas semanas para aliviar a dor poderiam tornar-se um vício.
O ator explicou à NiT que estava com uma depressão profunda e começou a tomar os opiáceos para a tentar adormecer. “O meu amigo tinha começado a tomar uma medicação muito forte para aliviar as dores que sentia na sequência de um acidente que sofreu. Recusou-se a tomar a oxicodona [um opiáceo analgésico conhecido por criar adição] por lhe condicionar significativamente a funcionalidade no dia a dia. Mas eu estava tão em baixo que achei boa ideia começar a tomá-los.”
Sempre que tomava um comprimido ficava com o discernimento alterado e receou ficar viciado. “A diferença do meu estado de espírito sob o efeito da oxicodona era gritante e assustadora. Percebi que poria gravemente a minha saúde em causa se continuasse a tomar.”
As semanas que Tiago passou agarrado à medicação do amigo foram o período mais difícil dos seis anos que viveu nos Estados Unidos. Em 2008, quanto tinha 25 anos, decidiu partir em busca de novas oportunidades na representação do outro lado do Atlântico. “Sempre quis saber mais, estudar, e claro, tinha o sonho que tantos atores têm, o de entrar definitivamente no mercado norte-americano. Poderia ser uma ilusão, mas na altura tinha muita energia e uma vontade desmedida de ter sucesso como artista”.
Assombrado pela depressão
Nem tudo foi o “mar de rosas” com que sonhou. Nos primeiros anos, como tinha bolsa e algumas poupanças, dedicou-se apenas aos estudos e tudo parecia correr sobre rodas. Porém, a realidade mudou. “Quando concluí o curso passei a depender do meu trabalho para sobreviver. Desdobrei-me entre a representação e a restauração.” Como ator fez uma longa-metragem, várias curtas, uma delas premiada no Manhattan Film Festival, alguns espetáculos de teatro off-Broadway e vários anúncios publicitários.
“Trabalhei em sete restaurantes. Alguns deles eram escandinavos e não sabia sequer o que servia. No início, havia muitos termos que não percebia e não conseguia sequer pegar em dois pratos ao mesmo tempo. Inventei um currículo para conseguir o emprego lá. E, os gajos só não me despediram na primeira semana porque tiveram pena de mim [risos]. Com o tempo, acabei por perceber da arte de servir e a experiência foi brutal.”
À medida que ia ganhado experiência no mundo da restauração, a saúde mental de Tiago começou a piorar. A doença que já o tinha assombrado após interpretar o famoso Crómio em “Morangos com Açúcar” voltou. Valter Matoso, o nome da personagem, era o nerd trapalhão que adorava química e bebia copinhos de leite todas as noites. Com o passar do tempo, começou a integrar-se na escola, junto dos colegas mais populares, e até teve um grande amor, que inevitavelmente acabou em drama. Quando as gravações terminaram, em 2005, estava com uma depressão.
Anos depois, em Nova Iorque, a doença regressou e “foi vivida com mais intensidade”. “Vivia numa tristeza permanente, perdi o interesse pela vida e deixei de sentir prazer com o que quer que fosse”, contou à NiT. “Tornou-se problemático porque me sentia incapacitado de sair de casa e procurar trabalho quando precisava de o fazer para sobreviver.”
Tiago tinha entrado numa espiral descendente da qual não conseguia libertar-se.“Para piorar, em 2014, um dos restaurantes onde trabalhei fechou sem aviso e ficaram a dever-me 12 mil dólares.”
Teve de pedir guarida a um dos poucos amigos portugueses que tinha em Nova Iorque que o acolhesse. “Isto [a falta de pagamento] por si só, já é uma contrariedade complicadíssima de gerir para um emigrante. E o facto de ter perdido o contacto, de um dia para o outro, com uma equipa que era quase como uma família, num país onde os afetos são muito difíceis de conquistar, agravou o estado da depressão.”
Quando regressou a Portugal, após atravessar aquela que considera ter sido “a fase mais crítica da doença”, voltou a pedir ajuda ao mesmo psicoterapeuta que o tinha ajudado em 2005.
“Durante a consulta, o médico disse-me que nunca conseguiria deixar a medicação para a depressão que me tinha receitado, pois era um doente crónico. Sentia-me bastante entorpecido com os fármacos e apesar de atenuarem os sintomas, condicionavam-me. Não me sentia funcional e não queria que aquilo fosse permanente. Então, nesse mesmo dia, em conjunto com a minha namorada [a atual mulher] decidi que ia deixar de os tomar. O processo foi lento, durou seis meses. Apesar de ter sido pensado e feito com todo o cuidado, foi doloroso, física e psicologicamente. Em junho de 2016 deixei, finalmente, a medicação.”
A força de vontade
Depois do “desmame dos antidepressivos”, Tiago Castro, atualmente com 39 anos, fez da saúde mental um das suas prioridades. Mudou o seu estilo de vida e implementou novos hábitos e estratégias que o ajudam a estar bem. Uma delas, como explica, passou por dar outro valor aos acontecimentos da vida.
“Redefini a importância do sucesso profissional. Antes, só os grandes acontecimentos profissionais me davam felicidade e passei a concentrar-me mais no dia a dia. Passei a sentir-me grato com coisas simples, que estavam ao meu alcance diariamente: caminhar junto ao mar, ter uma casa, uma família e uma mulher que amava. Deixei de estar focado no que ainda não tinha alcançado ou no que tinha perdido e foquei-me no que tinha no presente. Aos poucos, passei a ter mais momentos felizes. Agora, anos depois, esse estado instalou-se na minha vida. Hoje, considero que sou mesmo uma pessoa feliz.”
A atravessar uma fase muito positiva profissionalmente e satisfeito por voltar a dar a vida ao famoso Crómio em “Morangos com Açúcar”, confessou à NiT ter “dificuldade” em lembrar-se da pessoa que foi há uns anos. “Era mesmo muito diferente do que sou hoje”, reforçou.
Tiago Castro faz parte do elenco da nova temporada de “Morangos com Açúcar”. A coprodução da TVI e da Amazon Prime Video já está a ser gravada e deverá estrear no outono de 2023.
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