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Arte ou ultraje? A polémica estátua de Camilo Castelo Branco pôs o Porto em guerra

Uma petição exigiu a remoção da estátua. Rui Moreira deu a ordem. Agora, uma nova petição pretende reverter a decisão.
Está no local desde 2012.

Há mais de uma década que a estátua Amores de Camilo está exposta na baixa portuense, junto ao Centro Português de Fotografia. Feita por Francisco Simões, pretende homenagear as várias figuras femininas que pautam a obra do histórico autor português.

Nela, Camilo surge vestido, abraçado a uma mulher nua — uma figura que recorrentemente tem sido confundida com Ana Plácido, a mulher com quem viveu parte da vida, depois de ambos estarem presos precisamente na Cadeira da Relação, que ocupou o edifício contíguo.

O largo recebeu também o adequado nome de Largo Amor de Perdição, que recorda a obra que eternizou o amor das duas figuras. Literaturas e memórias à parte, aquele que poderia ser um marco de orgulho dos portuenses é, afinal, sinal de vergonha para muitos. Foi o que revelou uma petição assinada por mais de três dezenas de pessoas e entregue ao presidente da autarquia Rui Moreira.

A carta, revelada pelo “Público”, terá sido assinada por alguns nomes conhecidos. Desde logo António Lobo Xavier, antigo líder do CDS-PP e conselheiro de Estado, mas também os pintores Armando Alves e Carlos Reis.

Os signatários acusam a figura feminina à qual Camilo está abraçado de “exemplar mais ou menos pornográfico” e explicam que “o grande amor de Camilo foi Ana Plácido, cuja memória não merece o ultraje”. Falam também em “desgosto estético” e pedem o “favor higiénico de mandar desentulhar aquele belo largo de tão lamentável peça e despejá-la onde não possa agredir a memória de Camilo”.

Ilda Figueiredo, vereadora da CDU, é também uma das signatárias e critica a alegada “subalternização inaceitável” da mulher por parte da obra. “Não são questões morais nem de gosto que me levam a assinar a petição, mas a diferença na maneira como o homem e a mulher são tratados. Ana Plácido era uma mulher extraordinária que ali é menorizada. Querem pô-la nua, muito bem, não me oponho, desde que Camilo também esteja nu. Ou os dois nus, ou os dois vestidos”, refere ao “Público”.

O autor da obra nega e reafirma que sempre fez questão de revelar o sentido da obra. Que a figura não é Ana Plácido, mas uma “mulher simbólica” que “representa a mulher na obra de Camilo”.

Ao que parece, o pedido foi aceite por Rui Moreira que, segundo o “Público”, terá pedido ação ao vereador do urbanismo da autarquia. “Não tendo havido qualquer deliberação municipal para erigir tão deselegante obra [na época era Rui Rio o presidente da autarquia], e concordando com o que tão ilustres cidadãos nos suscitam, solicito que se proceda à remoção daquele objeto, que deverá ficar nas reservas municipais”, terá escrito o autarca.

Entretanto, os portuenses uniram-se e há já um grupo que se move em sentido contrário. Em poucas horas, surgiu na Internet uma petição “pela não remoção da estátua de Camilo” e que, à hora de publicação desta notícia, tinha já mais de 300 signatários.

“O Homem estar vestido e a Mulher estar nua, não tem que parecer, só agora, ao fim de 11 anos, que se trata de uma humilhação da Mulher desnuda em favor de um Homem vestido?. Não pareceu na altura, não parece hoje”, pode ler-se no texto que acompanha a petição que tem autores desconhecidos.

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